O projeto
Colecionador de Sacis, de Andriolli Costa, aproveitou
os cem anos do "Inquérito sobre o saci", uma pesquisa popular
realizada em 1917 por Monteiro Lobato nas páginas do jornal
O Estado de S.
Paulo, para lançar uma revista eletrônica inteiramente dedicada ao saci. Com
capa de William Chamorro, possui 83 páginas e traz textos de Ana Paula
Aparecida Oliveira, André Lima Carvalho, David Dornelles, Douglas Rainho,
Egidio Trambaiolli Neto, Elizeu Batista Thomé, Elói Bocheco, Gastão Ferreira,
Gláucia Santos Garcia, Itaércio Rocha, Jorge Alexandre, Lucas Baldo Fraga,
Margareth Assis Marinho, Neide da Cunha Pinto, Olívio Jekupé, Ronaldo Clipper,
Sérgio Bernardo, Tânia Souza, Victoria Baubier e Wallace Gomes. As fotos são de
Douglas Colombelli, Gustavo Beuttenmuller, Jessika Andras, Leo Dias de los
Muertos e Maurício da Fonte Filho, e as ilustrações de Adriano Batista, Alice
Bessoni, Altemar Domingos, Anderson Awvas, Anderson Barbosa Ferreira, Bruno
Lima, Fabio Dino, Fábio Vido, Fábio Meireles, Felipe Minas, Geraldo Borges,
Giorgio Galli, Ícaro Maciel, Joe Santos, João P. Gomes de Freitas, José Luiz
Ohi, Mikael Quites, Mil Araújo, Monteiro Lobato, Odoberto Lino, Rafa Louzada, Rafael
Pen, Rodrigo Rosa, Romont Willy, Stuart Marcelo, Talez Silva, Thiago Cruz
(Ossostortos), Ursula Dorada (SulaMoon),
Vilson Gonçalves, Waldeir Brito, Webby Junior e William Chamorro.
Texto divulgação: “Em 26 de janeiro de 1917, Monteiro Lobato
publica no Estadinho – o suplemento vespertino do jornal O Estado de S. Paulo
um artigo intitulado Mitologia Brasílica. Nele, convocava os leitores a
responder um breve questionário de três perguntas. Um Inquérito sobre o saci.
A resposta foi imediata. Lobato recebeu causos, contos e até
poemas inspirados pela figura do negrinho perneta, escolhido por ele como um
verdadeiro estandarte da cultura nacional. O duende empresta características
trindade formadora da identidade brasileira, negros, índios e europeus. Traz o
riso como enfrentamento, o deboche como arma. É o saci o mito que mais diz
sobre nós. Sobre todos nós.
O material recolhido se tornou um livro publicado no ano
seguinte: Sacy Pererê – Resultado de um Inquérito. Nele encontramos sacis de
todos os tipos: simpáticos ou agressivos; com uma perna direita, uma perna
esquerda ou até mesmo as duas. Sacis com rabos, com chifres, cascos ou orelhas
de morcego. Um documento que nos lembra que não existe um só tipo de saci, nem
mesmo trezentos. Sacis são infinitos, há um para cada crença.
Este marco tão importante na literatura folclórica
brasileira também não está livre de críticas. O antropólogo Renato Queiroz, em
Um mito bem brasileiro nos lembra que quem responde ao inquérito são
principalmente pessoas letradas, assinantes do Estadão. Assim há uma
predominância de histórias de estancieiros ou filhos de donos de escravos, o
que privilegia a demonização de características tipicamente negras: o nariz, os
“beiços”, o cabelo. Em estudos etnográficos em propriedades interioranas menos
elitizadas, essas características quase não foram levantadas ao se falar em saci.
Os mitos, vale lembrar, são mutantes e mutáveis. Nenhum
dicionário ou folclorista é capaz de cravar uma versão “verdadeira” de um ser
que não habita o texto do vernáculo, mas sim vive no imaginário do povo. Assim,
Lobato capturou com seu Inquérito um registro de seu tempo, um momento que
mostra toda a riqueza de um personagem que diz sobre o Brasil de tantas formas
diferentes.
Neste especial feito pelo Colecionador de Sacis para
celebrar os 100 anos do Inquérito, não pretendemos repetí-lo. O que pretendemos
é, assim como fez Lobato, mostrar o saci nas suas mais diversas formas. Como
ele é, como ele foi, como ele pode ser. Como a linda arte da capa de William
Chamorro faz transparecer, queremos mostrar vários retratos de saci. Tantos
quanto possível.
Nossa missão, nestes 100 anos de inquérito, é mostrar como o
saci ainda vive no dia a dia do brasileiro, mas em novas formas. O saci que
some com o dedal da costureira e trança a crina dos cavalos é o mesmo que dá nó
no fone de ouvido que fica no bolso. O mesmo que faz cair o 4G do celular. O
Saci não ficou na roça. Passeia entre nós. Não está restrito ao dia do folclore
nas escolas, nem às discussões contra Halloween que povoam as redes sociais.
Saci não é discurso, é mito vivo.
Vocês podem encontrá-lo nos grafites pelos muros de São
Paulo – e quero ver prefeito algum deixá-lo preso a um grafitódromo. Encontram
nas músicas, nas histórias em quadrinhos, na literatura e até nos vídeo-games.
Saci está nas brincadeiras, na cultura pop, nas histórias de nossos pais e que
logo serão as de nossos filhos. Saci está aí. Basta encantar o olhar, abrir bem
os ouvidos e escutar aquele assobio que arrepia a alma.
Esta revista foi feita com amor e carinho para todos aqueles
que buscam esse encantamento. A distribuição é gratuita, o preço é que você
leve as histórias que encontrar aqui adiante. Sua feitura também foi totalmente
voluntária. Agradeço a todos os ilustradores, escritores e colaboradores que
cederam seu trabalho com tanto entusiasmo para esta iniciativa. Incorporaram bem
o famoso mote de trabalho em equipe da Sosaci: “Sacis de todo o mundo, uni-vos!
Nada tendes a perder a não ser a outra perna!”.
Boa leitura e viva o saci!”
https://colecionadordesacis.com.br/2017/01/20/colecionador-de-sacis-apresenta-saci-perere-100-anos-do-inquerito/